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Porque nem tudo o que luz é ouro e nem tudo o que brilha é prata...
Ontem ao ser entrevistada pela grande Madalena Balça, perguntou-me o "porquê" de ter surgido este blog e, posteriormente a respectiva página do Facebook...
O blog em si, surgiu da necessidade de escrever...Escrever é para mim como um vício...Passo a vida com agendas, e papelinhos atrás. Guardo tudo, pensamentos, ideias, coisas que um dia gostaria de amadurecer e passar para o papel...A página no facebook surgiu por acréscimo, até porque nesta era das novas tecnologias não fazia sentido seguir só com o blog....
Depois surgiu a doença cancro...No pai do meu filho e no meu pai. Talvez por egoísmo, a minha relação com o Poppies, passou de escrever sobre mim, e passar a escrever sobre eles, sobre o que é esta vida de doenças más...Sobre as vicissitudes de uma família e amigos, que cumprem esta "pena", agrilhoados ao doente...
É uma espécie de "grito do Ipiranga", um apelo, para os que aqui chegam percebam que, afinal as famílias e amigos sofrem tanto ou mais que os doentes, mas em proporções diferentes...
É o facto de ter de libertar o sofrimento que me vai na alma, escrevendo, e por acréscimo, se com isto puder ajudar alguém, dou-me por satisfeita.
Quando escrevo, não o faço só por mim, faço-o pela minha família e a do pai do meu filho, faço-o por todos os que, por vergonha ou falta de coragem, não o querem fazer....Esta doença gera um sofrimento tal, que costumo dizer que é descer ao inferno e ficar lá...
Há tanto a ser feito para colmatar estas falhas da sociedade...Não existem centros de retaguarda, e os que existem são poucos e sem vagas, o apoio psicológico é à míngua, as equipas pluridisciplinares são poucas e não têm como chegar a todos.
Se o Poppies puder chegar a alguém, como já o fez, se o meu "egoísmo", ou "prostituição" da dor, servir para alguém que como nós, passa ou passará por esta provação, darei a minha missão como cumprida...
Não me importo de "escarrapachar" aqui, o que tem sido este último ano das nossas vidas, o que é fazer luto em vida, o que é saber que à partida a doença já nos derrotou, o que fica depois da morte de um deles...Não me faz confusão absolutamente nenhuma falar sobre isto...O que me faz confusão é, determinadas pessoas, ainda viverem confortáveis no seu "quadrado" e não perceberem que existem valores na sociedade tão importantes, como a própria sociedade...A isto chama-se, segundo os meus padrões, compaixão e humanidade...Eu ajudo-me, tentando ajudar os outros. Se é egoísmo, que seja. Mas ao menos sei que não estou só e que os relatos que aqui ficam, servirão para outros não perderem a esperança...
O meu pai continua na mesma...E nós, continuamos com ele.
O meu rico filho, continua a fazer o seu luto e nós, acompanhamo-lo...
Para ser grande, sê inteiro: nada
Teu exagera ou exclui.
Sê todo em cada coisa. Põe quanto és
No mínimo que fazes.
Assim em cada lago a lua toda
Brilha, porque alta vive.
(Ricardo Reis, 14-2-1933)
E amigos, família, e todos os outros que aqui passam.
Tive o previlégio de ser telefonicamente entrevistada, pela grande radialista Madalena Balça, um dos nomes incontornáveis no panorama da Comunicação Social...
Por isso, amanhã por volta das 23 h. oiçam a Antena 1, onde irei falar e, quem sabe estar em directo com os ouvintes...
Em breve deixarei o podcast, para todos, poderem perceber o porquê deste blog e da página no facebook. Sem margem para dúvidas...
Podem ouvir aqui
Primeiro que tudo, e desviando-me obviamente do assunto, tive muita, muita pena mesmo de não poder ter ido à manifestação. No entanto, sei quem foi lá por mim, e levou um pouco de mim consigo, já que se tivesse ido, certamente iria na linha da frente...
...
Adiante que o dia de ontem já passou.
E passou uma semana.
É verdade... Uma semana complicada, em que afinal aprendemos, que até para fazer luto o tempo passa devagar...
O luto não é a roupa que vestimos, são os apertos que sentimos no coração, por vermos os sentimentos dos que amamos esfrangalhados e, os nossos já agora. (Desculpem a expressão, mas à falta de melhor...Vocês entendem.)
A roupa é apenas um pró-forma, para que outros vejam que estamos a passar um processo doloroso. Por mim, jamais verão. O luto faz-se para dentro, por vezes, no entanto, somos traídos pelos olhos...Que teimam em deixar cair lágrimas, como sinal de alivio, por a alma já não aguentar tamanho sofrimento...
Apesar de estarmos à espera da morte do Paulo, nunca estivemos realmente preparados para lidar com a sua perda e, a cada dia que passa, a saudade aumenta tanto, quanto a falta da sua presença.
Só com o passar dos dias começamos a ver que afinal, é a sério...Ele partiu. O seu corpo físico deixou de existir. Existem as lembranças, boas e más, as memórias...O som da voz dele, das suas gargalhadas, o sorriso...O sorriso fica sempre entre nós, já que o filho tem exactamente o mesmo sorriso do pai...O mesmo jeito de andar com os pés para a "doca"...
A morte do Paulo, para mim, não é só a morte dele, é um prenúncio daquilo que terei de ultrapassar quando o meu pai partir...Do apoio que tenho de dar aos meus filhos e, eles a mim...Acho que não vou ter tempo para parar para pensar, hei-de estar absorvida por tantas outras coisas maiores que as suas perdas...Os meus filhos, a minha mãe...
Quando tiver tempo faço o meu luto. Da minha forma atípica. Hei-de chorar, hei-de me rir, terei tempo para gritar com eles os dois, com a vida, com o maldito cancro...Com alguém! Ou com coisa nenhuma...
Isto da morte e do luto tem muito que se lhe diga, tanto que ainda ando a processar informação...
Em nome do meu filho e da sua família mais próxima, venho agradecer-vos...
A vós, que nos conhecem e a todos os outros que mesmo sem nos conhecer, estiveram do nosso lado.
Por todos os actos, palavras, gestos de carinho...
Pelo facto de terem seguido este trilho do nosso lado, sem vacilarem quando nós perdemos o rumo e, lembrando-nos de que não estamos sós.
Obrigada...Por lerem os nossos desabafos, as coisas que temos cá dentro e se não deitarmos para fora, nos consomem.
Pelo simples facto de estarem aí, sabendo que deste lado, se vive a vida real, sem rede nem duplos.
Obrigada a todos sem excepção, mas a alguns, que sabem bem quem são, por todos os comentários, sms's, mensagens privadas...
São todos almas boas, que felizmente tornam o nosso caminho menos turtuoso e complicado.
...
Queria dizer, agradecer, fazer muito mais, para que sentissem verdadeiramente a nossa gratidão, mas acho que um simples Obrigada, é suficiente e, na falta de palavras, nos silêncios desta vida, também percebemos o quanto somos agradecidos...
A nossa vida tem de continuar, apesar da dor e da falta que um homem bom e jovem nos faz...
Ficamos mais pobres, mas ao mesmo tempo mais ricos, por todos os amigos virtuais e reais que fizemos...
O pai do meu filho partiu cedo demais, o meu pai continua na sua luta...
Remexer, vasculhar, meter o nariz...Realmente não pensamos muito no que acontece depois de morrermos.
Alguém é incumbido de "fazer a limpeza" da nossa vida. Certificar-se dos assuntos pendentes, dar baixa do que houver para dar...
Contactos e mais contactos com entidades, pessoas... O fim não acaba com a noticia da morte. O fim acaba, quando podemos dizer que está tudo tratado.
E tudo leva tempo e, é desgastante e cansativo...
O luto, só pode começar depois, porque entretanto, estamos absortos nos papeis, a comunicar o falecimento...
Ontem o pai do meu filho foi entregue em casa.
Pudesse ele ver a desarrumação que lhe fiz no quarto e, provavelmente me teria atirado com algo à testa!
Ele odiava que lhe mexessem nas coisas.
Ontem fiquei confusa...Porque ele faz-me falta.
Já estávamos divorciados à tantos anos, eu recomecei a minha vida, tornei a casar, mas ele foi um amigo/irmão que perdi. Com a diferença de que tivemos um filho...
Ontem falei muito com ele, para que não ficasse zangado pela confusão que instalei no quarto dele. Pedi muitas desculpas, mas teve de ser...
Vi fotos e mais fotos do que foi a vida dele. Surpreendi-me por ter ainda guardados, as ofertas do nosso casamento, as flores que enfeitavam o bolo de noivos...Até recadinhos de amor que escrevemos um ao outro...
É triste.
Pensar que ele ainda tinha tanto para viver e, partiu de uma forma tão dolorosa...
Abrir a carteira dele e ver, religiosamente guardadas as fotos do filho, mãe, irmão mais novo e prima...
Ter de ler todos os papelinhos, remexer em tudo...
O nosso luto ainda não pode começar....Existem muitas "pendências" por resolver e, isso é uma grande treta.
...
Ontem o meu pai teve consulta...Segundo o médico, neste momento já é considerado um milagre da medicina...Mas melhoras não existem, apenas um estado de "suspensão" dos sintomas e progressão da doença...O meu pai está cá. O pai do meu filho já descansou...
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